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sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Os caminhos da Ciência

1.Breve Introdução
Este artigo tem por objetivo resgatar as três principais concepções de ciência presentes na História, analisando suas relações com o conceito de pesquisa e discutindo as conseqüências das mudanças dos paradigmas para o avanço do saber cientifico.
Para o senso comum, fazer ciência significa utilizar métodos e técnicas objetivos que garantem o acesso à verdade existente na realidade na qual o objeto está inserido. Assim, é considerado cientista todo aquele que utilizando métodos quantitativos consegue explicar a leis e características de um objeto visível na realidade.
Quando visitamos os caminhos percorridos pela ciência na História, compreendemos que essa visão que se mantém no senso comum até a atualidade, faz parte de uma das fases de constituição do saber cientifico. Fase que foi superada graças a atitude cientifica de desconfiar daquilo que aparentemente é uma verdade absoluta.Foi duvidando e problematizando suas próprias verdades que o saber cientifico avançou.
Talvez seja essa a principal diferença entre o conhecimento originário do senso comum e o conhecimento cientifico: enquanto o primeiro enxerga fatos e verdades absolutas, o segundo vislumbra problemas e aparências que precisam ser desvendadas.
2. Os caminhos da ciência e da pesquisa: três concepções
Um rápido olhar pela história permite identificar três concepções principais de ciência: racionalismo, que se estende do mundo grego até final do século XVII; empirismo, que se inicia em Aristóteles e na medicina grega, estendendo-se até o final do século XIX; construcionismo, muito presente no século XX, principalmente nas Ciências Sociais.
Para os racionalistas, a ciência era compreendida como um conhecimento racional dedutivo e demonstrativo, direcionado a provar a verdade universal de seus enunciados e resultados. Nessa perspectiva, o saber cientifico era formado por axiomas, postulados e definições que existiriam a priori como representações da realidade, sendo função da pesquisa cientifica unicamente verificar e confirmar aquilo que já estava objetivamente definido na realidade.
Na concepção empirista, o objetivo do saber cientifico era interpretar a realidade a partir da observação e do uso da razão. Com a utilização de métodos de pesquisa rigorosos, o cientista tinha a função de produzir teorias capazes de explicar o objeto inserido na realidade a partir de suas propriedades, leis e funcionamento.
Nas duas concepções, não havia a intenção, nem a possibilidade de intervenção do saber cientifico sobre a realidade, o pressuposto que direcionava a pesquisa era de que a ciência servia para contemplar a verdade existente na Natureza.
A partir do século V, com a desagregação do Império Romano Ocidental e as invasões germânicas, a Europa passou por um período de retração das atividades urbanas e comerciais. O homem buscou segurança no isolamento da vida rural, feudos, e descanso para as inquietações do espírito na Igreja, religião. Isolados nos feudos e reconfortados por uma religiosidade que procurava explicar e controlar todos os aspectos da vida social, o homem medieval não abandonou por completo o trabalho intelectual, mas sua vivência cotidiana já não era orientada pelo racionalismo ou empirismo, o exercício da ciência constituía uma verdadeira aventura uma vez que para os padrões religiosos da época a linha entre feitiçaria e ciência era praticamente inexistente.
Somente com a crise do feudalismo, a partir do século X e as atividades das Cruzadas que promoveram a aproximação do europeu com o Oriente, o homem medieval foi retomando aspectos que ficaram abandonados por mais de cinco séculos, o comércio, a vida urbana, o uso da razão, foram gradativamente promovendo a passagem de uma cultura teocêntrica para uma cultura antropocêntrica.
O Renascimento em suas várias expressões (cultural, urbano, comercial) libertou o homem da Europa medieval, do isolamento dos feudos e do controle religioso, levando-o a reivindicar o lugar de centro do Universo.
Em um cenário marcado pela efervescência, o discurso cientifico passou a ser valorizado principalmente pela burguesia que precisava legitimar seus interesses sociais, econômicos e políticos. A crença em Deus não foi abandonada, mas ganhou maior racionalidade, principalmente com o advento da Reforma Protestante na Alemanha e sua posterior ampliação pela Europa.
Até o final do século XIX, racionalistas e empiristas ofereceram o instrumental teórico e metodológico para explicar os fatos da realidade. No entanto, vale destacar que embora ambos tenham surgido na antiguidade clássica, as dinâmicas sociais impuseram algumas mudanças na essência de ambas as concepções: a ciência à serviço de uma explicação contemplativa não atendia aos interesses da burguesia, era necessário o uso de técnicas que tornassem o homem senhor da Natureza.
A ciência moderna nasceu ligada à idéia de intervenção na Natureza, promovendo profundas transformações nos métodos de pesquisa e provocando uma reflexão sobre a relação sujeito/objeto.
Como filosofia e fé não bastavam para ordenar e dar significado a um mundo em constante transformação, o homem desenvolveu métodos e técnicas com o objetivo de racionalizar todos os processos produtivos, fossem eles intelectuais ou materiais. Pode-se afirmar que a partir de Descartes, para quem a ciência deveria assegurar o domínio sobre a Natureza, o saber cientifico assumiu o ponto central para o conhecimento da realidade.
No século XX, o ideal construcionista defendia um modelo de objetividade nascido da idéia de razão como conhecimento aproximativo da realidade, e combinou dois procedimentos, um vindo do racionalismo e outro do empirismo. Nessa concepção, ao mesmo tempo em que o cientista utiliza o método para estabelecer um quadro teórico sobre o objeto estudado, também espera que o método contribua para a modificação do modelo teórico existente.
Como o objeto é resultado de uma construção lógico-intelectual e metodológica, o cientista construcionista não tem por objetivo chegar a uma verdade absoluta sobre o objeto estudado, mas a uma verdade aproximada que pode ser corrigida, transformada ou abandonada por outra mais adequada.
3. Pesquisa Qualitativa ou Pesquisa Quantitativa?
Para o sociólogo Florestan Fernandes (1959, p.54-55) o “método é o mesmo em todos os ramos do saber”, ou seja, para toda e qualquer ciência existe um traçado geral das etapas que devem ser cumpridas para uma investigação cientifica. No entanto, deve-se reconhecer que nas ciências sociais, diferente das ciências naturais, existe uma maior dificuldade para isolar o objeto de estudo em um laboratório e quantificar suas características de forma isolada.
Da necessidade que as ciências sociais expressaram para garantir a cientificidade de seu objeto, surgiu o embate entre o método qualitativo e o método quantitativo. Isso não supõe a existência de uma abordagem superior a outra, significa que o tipo de problema e o objeto com o qual se trabalha é que acabam por definir o melhor método.
A pesquisa quantitativa é especialmente utilizada para testar uma hipótese em uma realidade determinada, onde o foco é conciso e limitado e precisa-se garantir certa generalização matemática. O pesquisador utiliza o raciocino lógico e dedutivo, mantendo-se distante do evento analisado e procurando estabelecer relações de causa e efeito entre os dados coletados. Teoricamente, há garantia de uma maior objetividade no resultado das análises.
A abordagem qualitativa trabalha com múltiplas realidades e a relação sujeito/objeto é muito próxima. A teoria é desenvolvida em um espaço que envolve, descrição, compreensão e interpretação, elementos carregados de subjetividade e que são compartilhados entre o sujeito-pesquisador e o sujeito-objeto, portanto, o raciocínio desenvolvido é dialético e indutivo comprometido com a qualificação das informações obtidas.
Mais do que a abordagem quantitativa, a abordagem qualitativa desperta questões éticas com relação a neutralidade do saber cientifico. Como a relação sujeito/objeto, na pesquisa qualitativa, ultrapassa os limites de um discurso estatístico, principalmente nas pesquisas realizadas na área das ciências sociais onde o pesquisador muitas vezes escolhe o seu objeto por questões ideológicas, o risco da perda da cientificidade por parte do pesquisador é muito grande.
Embora a produção do conhecimento encontre-se sempre associada a um sistema de valores, interesses e ideologias, social e historicamente definidos, ao trabalhar com a pesquisa qualitativa, o pesquisador deve evitar o erro de defender bandeiras ideológicas. A interação com o “outro” que além de objeto é também sujeito, não pode ser determinada pela intencionalidade de dar uma direção, de acordo com um projeto político particular.
Talvez o caminho ideal para uma pesquisa seja conciliar, sempre que possível as duas abordagens, reconhecendo que o projeto maior é “conhecer”, no sentido de garantir a autonomia de todos os sujeitos envolvidos e beneficiados pelo saber cientifico.

4. Crise de paradigmas e revolução cientifica
Segundo Thomas Khun (1962), “cientistas muitas vezes agem como se estivessem mais interessados em impedir o progresso cientifico do que em promovê-lo”. Isso ocorre porque as comunidades cientificas organizadas em torno de um paradigma tendem a não aceitar que o mesmo seja colocado à prova, refutado ou transformado.
Os paradigmas podem ser conceituados como um modelo teórico que serve como referência para o fazer cientifico de uma determinada comunidade de cientistas durante um período de tempo determinado, mas que tende a transformar-se diante da dinâmica da sociedade que exige transformações constantes dos modelos teóricos que estudam a sua realidade.
A necessidade de mudança de paradigma ocorre quando uma determinada comunidade cientifica percebe que o seu modelo teórico não é suficiente para explicar o fenômeno que estão estudando. Os conceitos, os modelos e procedimentos existentes oferecem uma barreira ao avanço do conhecimento, ou no dizer de Bachelard (1938) apresenta-se um “obstáculo epistemológico” que precisa ser superado com a elaboração de novos modelos teóricos e tecnológicos, que acabam por promover uma mudança em todo o conhecimento existente.
Para Thomas Khun (1962), esse momento de ruptura epistemológica ou quebra de paradigma, consiste em um momento de revolução cientifica, como foi por exemplo o surgimento da teoria de Copérnico ao substituir a teoria geocêntrica pela heliocêntrica.
A revolução cientifica é um momento bastante difícil para o cientista pois consiste em uma revisão de todas as suas crenças e valores, promovendo um abalo que o obriga a sair do espaço de conforto de sua teoria para mergulhar em uma zona de instabilidade que envolve o debate com membros de sua comunidade cientifica e de outras comunidades igualmente interessados ou não, no avanço da ciência.
Embora a ciência esteja confortavelmente segura no paradigma tradicional da neutralidade do saber cientifico, que eleva a ciência à categoria de saber verdadeiro e superior que avança de forma linear em uma idéia de progresso cientifico, os embates teórico-metodológicos são freqüentes e fazem com que a ciência caminhe por saltos e revoluções.










Referências Bibliográficas
CAPRA, Fritjof. O Ponto de Mutação. São Paulo: Cultrix, 1982.
CARVALHO, Alex et al Aprendendo Metodologia Cientifica. São Paulo: O Nome da Rosa, 2000, p. 11-69
FERNANDES, F. Fundamentos empíricos da explicação sociológica. São Paulo:Companhia Editora Nacional, 1959.
KUHN, Thomas. A Estrutura das Revoluções Científicas. São Paulo: Perspectiva, 1989.